sábado, 31 de julho de 2010

O causo da Beba Doida



O cara chega de frente,
Ela já olha de lado,
E toda incondescendente
Desenbucha o seu recado:


- Credo em cruz, Ave Maria
Que comigo é diferente
Pois eu só dou ousadia
Pra homem reto, descente,
Você nem olhe pra mim
Não pense que é assim
Eu não sou pro seu biquinho
Volte ali pra seus amigos
Fiquem sós, com seus consigos,
Qu’eu fico aqui com meu vinho!

Eu sou quimera avançada
Produto de exportação
Não sou roupa vitrinada
Com nome “liquidação”
Sou loira do olho azul
Numa burca de Istambul
Qu’é pra ninguém me secar
E eu vejo em sua testa
Que você é fim de festa
Vai-te embora, vai pra lá!

Algumas horas depois
O vinho sobe ao juízo
E entre entãos e apois
Ela surge sem aviso:


- Oi moço, lembra de mim
Perdoe lhe incomodar
É que a festa tá no fim
E eu vim me desculpar
Hoje cedo fui tão grossa
Espero que você possa
Relevar o que falei
O meu jeito é meu suplício
Não sou assim tão difícil
Ante os vinhos que tomei

E esse vinho é docinho,
É docinho além da conta
Vem sentar aqui pertinho
Eu já tou ficando tonta,
Passe a mão na minha nuca
Me deixa doida, maluca
Me cutuca, me atiça
Vem matar a minha sede
Me sacode na parede
Me chama de lagartixa!

E o cabôco num relance
Busca se valorizar
Sem deixar fugir a chance
Da galega faturar:

- Olhe moça, vou contar,
Eu não gosto de maluca
Que me manda ir pastar
E quando enche a cumbuca
Pensa que eu sou de graça
Qu’eu sou um banco de praça
Ao dispor de qualquer dama!
Eu não sou tão fácil assim
Mas de cara emendo um: Sim,
Hoje nós divide a cama!

João Pessoa, 31/07/2010.

quinta-feira, 29 de julho de 2010

Arrazoando



Outra noite fui à praia
Com meu saco de dormir
E deitei-me na areia
Vendo as estrelas sorrir
Enquanto que a maresia,
Do mar para a rua, ia
Como uma fina bruma
Que eu calculei que deve
Ser feita do branco neve
Das ondas que tem espuma!

E lá estimei também
Na minha imaginação
Que no céu ainda tem
Vaga pra constelação
E tendo assim concluído
Tratei de ter escolhido
Um bom pedaço de céu
Onde vou mandar colar
Um arranjo estelar
Com estrelas de papel!

João Pessoa, 29/07/2010.

terça-feira, 27 de julho de 2010

Amor rabo de lagartixa



Só ela tem esse jeitinho de ser acanhada
Da enrolada que embola todo o embuá
Ao s'embrulhar ante o perigo de ser maculada
Pela pegada de quem só faz gosto lhe amar!

E tem também esse jeitinho de ser tal um ganso
Que hora é manso e no ciúme perde toda a classe
Mas, nesse impasse, vou e volto tal qual um balanço
E só não canso porque sempre nosso amor renasce.

Pois nosso amor é feito um rabo de lagartixa,
Que se espicha mesmo após ter sido amputado
E, decepado, reza a lenda que serve de ficha
Pra outra bicha ser gerada do rabo cortado!

João Pessoa, 27/07/2010.

Bom dia, bundacanastra!



Ao acordar dê bom dia
para o seu ventilador;
saia do quarto e sorria,
dê bom dia ao corredor;
caminhe até o banheiro
e dê bom dia ao espelho
que o seu rosto espelhou
e, tirando a catotinha,
dê bom dia pra espinha
que no seu nariz brotou!

Quando for sair de casa
dê bom dia à maçaneta,
ao ônibus que atrasa,
a zoada da roleta;
dê bom dia à calçada
ao buraco, a topada,
ao preto, ao branco, ao marrom;
dê bom dia a tudo quanto
e repita tanto e tanto
que seu dia será bom!

João Pessoa, 26/07/2010.

quinta-feira, 22 de julho de 2010

João sem Maria



João amava Maria
com toda sua existência
e pra lhe dar alegria
tirava da sua essência
pedaços de sua alma,
sem ver que deixava um trauma
que não teria indulgência...

Pois Maria era tão linda
e tinha tanto esplendor
que ganhara o apelido
de ser a Maria Flor,
uma flor de brilho próprio
que pra João era um ópio
que lhe drogava de amor!

Foi então que de repente
Maria desencantou
e deixando João doente
foi embora e não voltou.
Partiu pela porta aberta
deixando a casa deserta
de tudo que João amou...

E tal qual o passarinho,
que perdendo sua amada,
fecha a porta do seu ninho
e segue só sua estrada;
João virou João-de-barro,
barro ruim que não dá jarro
pra outra flor ser plantada!

E há quem diga que então
João só espera a morte;
outros já dizem que não,
que pra tudo há um norte,
mas o certo é o entretanto
que se for sorte amar tanto
é melhor viver sem sorte!

João Pessoa, 22/07/2010.

quarta-feira, 21 de julho de 2010

Pei-bufo III



Não há antiinflamatório
Ou outro medicamento
Que desinflame meu peito
E acalme meu batimento
Desde que assim sem aviso
Eu vi este teu sorriso
Tomar o meu pensamento

Olhei-te e uma agonia
Me afligiu bem aqui [mostrar o peito]
E esta patologia
Só irá se extinguir
S’eu tomar um comprimido
Feito do beijo atrevido
Que eu vim roubar de ti...


IX Encontro Científico dos Estudantes de Medicina
UFPB, 19/07/2010

segunda-feira, 19 de julho de 2010

Desarrendamento

http://arrepare.blogspot.com/2008/12/arrendamento.html



O vento que te assanha
já não me acaricia;
do contrário, aumenta a sanha
de não te ver mais um dia
e, num tufão, é adaga;
que rasga as velas, naufraga
e afunda meu bem-estar
lembrando-me teu sorriso,
por isso o quê mais preciso
é que pare de ventar...

Onde estava meu bom senso
ao te arrendar meu peito
acreditando no intenso:
“Vou cuidar dele direito...”
Hoje eu vejo, foi besteira
abrir de cara a porteira
e permitir que você
cultivasse lá a terra
que hoje só mato encerra
vendo tudo esmorecer!

Porém o meu peito é forte,
massudo e ruim de morrer;
é terra preta do norte,
o mais puro massapé,
e passado esse tormento
não mais faço arrendamento
pra ninguém lhe cultivar,
temendo a monocultura
que mata o solo, em que apura,
depois da safra acabar...

João Pessoa, 19/07/2010.

domingo, 18 de julho de 2010

Inquietude

Pense adiante, não pense em vento... o meu futuro também mora no seu pensamento



Nascemos pra algo grande,
algo maior do que a gente,
algo que só se expande
no imaginário da mente,
porém o mundo num gole
nossa grandeza engole
e nossa mente atrofia,
com seu sistema vulgar
nos fazendo acreditar
que não temos mais-valia!

Mas nós somos semi-deuses
em potencialidade,
só usamos poucas vezes
toda a nossa habilidade
e este ponto é o divergente;
pois se organicamente
todo homem é igual,
o destaque caberá
a quem melhor aplicar
sua destreza mental!

Sendo assim preste atenção,
veja a massa de manobra,
não caia nessa ilusão,
pois o tempo dá e cobra...
Não deixe que o mundo mande;
busque fazer algo grande
pra você mudar o mundo,
que hoje bebe o veneno
do pensamento pequeno
desse sistema imundo!

Timbaúba, 18/07/2010.

domingo, 11 de julho de 2010

O cabaré, o bêbado e o poeta



Quatro e tarará da manhã e o cabaré ainda é!

Vive na forma de restos funestos de quatro ou cinco desiludidos (e embevecidos) debruçados sobre as mesas, agora cochilando suas desgraças, seus tempos perdidos.

Numa mesa mais ao canto vê-se uma dama das alcovas acariciando, sem encanto, o peitoral esquelético de um bóia-fria (operário da cana) que ainda ostenta no bolso algumas moedas, um resto de dinheiro, do honorário suado da boa safra que brotou pra o usineiro...

Enquanto isso ninguém se safa de ouvir o bêbado que chora alto suas lamúrias na mesa mais ao centro. E em seu intento, numa melancólica pintura em preto e branco este bêbado protagoniza a paisagem, tendo sua mão erguida ante a dignidade caída! Vencida...

E é neste arranjo físico que o ébrio sofredor, com sua mão alçada, canta os fantasmas de sua vida calejada (e a perda de sua amada) na forma de uma canção do grande poeta dos bordéis, o menestrel dos melhores e piores cabarés.

Assim o sol vai nascendo e vendo: o bêbado balbucia seu tom mais grave, estragando uma linda canção do saudoso boêmio Nelson Gonçalves...

E um poeta, vendo isso e coadjuvando complacente da mesma dor, desfecha a noite rabiscando um guardanapo com o seguinte arremate:


Nosso sofrer se resume
a não poder, nesta hora,
sentir o brando perfume
daquela doce senhora
que por um tolo ciúme
nos deixou e foi embora!

Sofremos só por querer
como queremos agora
e bebemos pra esquecer
ou mesmo pra por pra fora...
Deixa a lágrima descer,
louco é quem sofre e não chora!



João Pessoa, 29/06/2010.

terça-feira, 6 de julho de 2010

Não peguei porque era mole!



Lembro bem da empregada
Da casa da minha tia
Com a nádega empinada
Enquanto limpava a pia
Lembro qu’ela me ouriçava
Me olhava, me cantava
E eu mais frouxo que um fole
numa desculpa qualquer
SÓ SEI QUE ESTA MULHER
NÃO PEGUEI PORQUE ERA MOLE!

Lembro da Universitária
No congresso regional
Que sem conversa primária
Me chamou pr’os afinal
Me chegou e disse assim:
“Hoje eu quero tu pra mim,
Pra fazer um bole-bole”
Que no susto eu dei no pé,
E TAMBÉM ESTA MULHER
NÃO PEGUEI PORQUE ERA MOLE!

Lembro bem daqueles olhos
Na festa olhando pra mim
Lembro daquela piscada
E daquele “bilhetin”
Onde ela escreveu
Que por mim se derreteu
E eu devia dar-lhe um gole
Mas eu todo Zé mané
JÁ SE FOI OUTRA MULHER
NÃO PEGUEI PORQUE ERA MOLE!

E ainda a Margarida
Lá da rua da areia
Querendo ser a comida
Meu banquete, minha ceia
Lembro bem da promoção
Com tudo que é posição
E até do chupe-engole
E acredite quem quiser
QUE ATÉ ESTA MULHER
NÃO PEGUEI PORQUE ERA MOLE!

Mariane, Maytê
Helen, Glória e Juliana;
Melina, Márcia , Tetê
Tereza, Mayara, Alana;
Larissa, Bianca, Aline
Carolina, Caroline,
Deise, Leila, sua prole,
E nem tu não mais me quer
E ESSE TANTO DE MULHER
NÃO PEGUEI PORQUE ERA MOLE!

João Pessoa, 06/07/2010.

sábado, 3 de julho de 2010

Coração, bola de sopro!



Coração, sem endereço,
segue um rumo itinerante.
Cada peito um recomeço
e um fim não tão distante!
Coração, de canto em canto,
ofertando seu encanto
vai ganhando estadia;
porém não sendo o bastante,
tal caixeiro viajante,
vai embora no outro dia!

Coração, só, não escapa...
De vitória assegurada,
sempre sobra e derrapa
ante a linha de chegada.
Segue sem rumo, sem jeito,
por querer morar no peito
que não lhe dá moradia
e de assopro em assopro
é uma bola de sopro
que, furada, se esvazia!

João Pessoa, 03/07/2010.

sexta-feira, 2 de julho de 2010

Sina Meteórica



Voa o meteorito
Tendo toda a liberdade
Vai rasgando o infinito
Recortando a imensidade
Até quando a gravidade
Puxa o corpo retirante
Prum caminho lancinante
Por entre o céu e a terra
A livre pedra se encerra
Num risco de luz distante

João Pessoa, 12/06/2009.

quinta-feira, 1 de julho de 2010

É baião de sete!



Aprume a camisa, aperte a chinela
Ajeite o cabelo e a sobrancelha
Agora procure por uma parelha
Se achegue e exclame o quanto ela é bela
Depois já emende pra linda donzela
Que ao olhar pra ela perdeu todo o ar
Acenda um sorriso e a chame pra dançar
Ao som do mais puro forró do nordeste
Um bole virado de cabra da peste
Que o Baião de sete chegou pra tocar!

Desfile com seu vestidinho rodado
Cortado da peça da mais bela chita
deixe que eles vejam os laços de fita
que prendem as tranças do seu penteado
desfile mostrando todo seu gingado
depois dê um tempo no mêi do salão
e veja que os cabras se estapearão
brigando pra ver quem vai lhe convidar
para ralar-bucho, para ser seu par
ao som desses sete tocando baião!

O salão tá cheio de gente bonita
De gente cheirosa, de gente arrumada
De gente solteira desacompanhada
De gente abastada, de gente erudita
De gente elevada, de gente bendita
De gente que é gente do mais fino dote
Pois nessa festança não entra pixote
não tem gente feia, não dá periguete
só dá o filé nesse baião de sete
pra dançar colado ao som de um xote!

Timbaúba, 27/06/2010